Marketing Modernista
Por Fernando Adas
12/05/2010

Tarsila do Amaral pintou "Operários" em 1933, após uma viagem que fez para a antiga União Soviética. O quadro retrata vários rostos representando trabalhadores de uma fábrica, vista ao fundo. Dizem que muitos dos rostos remetem a artistas e intelectuais da época, o que colaborou para a divulgação da obra e da causa social destacada.

A tela é emblemática em vários aspectos e nos motiva à reflexão sobre a diversidade social e econômica dos trabalhadores e, sobretudo, dos consumidores. A forma dos rostos é semelhante. Os conteúdos e detalhes, totalmente diferenciados.

As pessoas estão à frente da empresa e não o contrário, ou seja, pessoas físicas são mais importantes que as jurídicas. Entretanto, empresas sempre estão a nos observar e a tentar nos entender, mesmo quando nos olham pelas costas. E é lógico que se você olhar o seu cliente pelas costas, jamais vai conhecer e entender suas peculiaridades físicas e comportamentais.

Embora produzida há quase 80 anos, a obra é de uma atualidade incrível e nos motiva à reflexão sobre os desafios da comunicação nos tempos atuais. Nosso olhar, ainda vê o consumidor pelas costas, quase todos iguais. Em nossas campanhas, quem toma cerveja aprecia pagode, quem compra margarina é casada e tem dois filhos, quem entra em um banco esboça um sorriso em clima de férias e quem dirige um carro nunca se preocupa com o combustível e tem uma linda mulher ao lado.

Sabemos que o perfil de família mudou nos últimos 30 anos. Mulheres saem para trabalhar e respondem por quase 1/3 das rendas domiciliares brasileiras. Homens vivem juntos e querem adotar filhos. Pessoas vivem sozinhas e felizes "para sempre". Idosos dão a volta ao mundo e fazem lipoaspiração. As oportunidades de trabalho surgem fora das grandes corporações e abandonam a carteira assinada e os holerites. O lazer tem se individualizado e as experiências reais transformam-se em virtuais. Por consequência, somos expostos a quantidades maiores de informação e a menor teor de formação, o que significa dizer que a aquisição de conhecimento se horizontalizou. Sabemos pouco sobre muitos assuntos.

E como isso tudo impacta os negócios empresariais?

Saia do seu escritório e vá até uma loja de roupas femininas. Não será difícil perceber três mulheres casadas, de 35 anos, com escolaridade e endereços semelhantes, relacionando-se de maneiras diferentes em relação a uma roupa.

Uma delas é a consumidora clássica que valoriza modelos um pouco abaixo do joelho, cores entre o bege e o marinho, estampas florais ou "pois" e pouco espaço à ousadia. São consumidoras seguras dos seus limites e da sua adequação. Sabem o que querem e o que lhes cai bem e, por isso, são pouco sensíveis a apelos publicitários e a modismos. A clássica "se garante", para usar uma expressão tão clássica quanto ela.

Entretanto, uma segunda atitude de moda surge com muita frequência e de maneira ascendente. É a mulher contemporânea, aquela que já saiu de casa, gera renda e, por vezes, sustenta a si e à família. Roupa para ela é passaporte de entrada ao mercado de trabalho e ao meio social. Como a jornada de trabalho é longa, precisa de peças que amassem pouco e sequem muito rápido. Ousadia em moda denota personalidade, mas precisa ser dosada na medida da cultura corporativa.

Além da mulher clássica e da contemporânea, temos também uma terceira atitude muito ligada às novidades e ao efêmero. É a mulher que não quer ter nada no closet, por mais de quatro meses. Ela precisa estar ligada às novidades para reforçar o fato de que é atual, moderna, on-line. Menos segura que a mulher clássica, a mulher "fashion" consome quilos de revistas e sempre se mostra disposta a ser a primeira a usar a pulseira que acabou de ser desfilada em Milão.

Agora volte ao escritório e reflita. Percebe como as atitudes de três mulheres iguais podem ser diferentes e até opostas? Elas podem até ser vizinhas. Mas jamais serão amigas.

Por isso, as pesquisas de comportamento e a criação de um banco de dados sobre as atitudes de compras são cada vez mais importantes para a definição do posicionamento da marca. Tarsila do Amaral, uma mulher ousada para o seu tempo, percebeu isso e soube retratar essa diversidade com arte e beleza. A tela dedica mais espaço às pessoas que à empresa. Clientes são mais importantes que os produtos. Não o contrário.

Na tela, os operários crescem em volume e grandeza. O mercado também cresce e se avoluma, diversifica-se e segmenta-se. Precisamos entender e explorar esse fato com competência e eficácia.

Fácil? Não. Impossível? Também não. Apenas requer pré-disposição e esforço. "Queimar neurônios", como dizem por aí. Percebe uma das chaminés da fábrica?

*Fernando Adas, diretor de planejamento e atendimento da FM – The Fine Marketing, é um especialista em Treinamento de Vendas, Comunicação de Varejo e em Projetos de Atendimento e Relacionamento em Marketing Direto.
E-mail: fernando@fmarketing.com.br
Site: www.fmarketing.com.br
Blog: http://blog.fmarketing.com.br