O Grafismo como Linguagem
Por Rafael Souza Silva
02/05/2007
A história das civilizações aponta o senso inato de organização e
uma natural inclinação do homem pela proporcionalidade. As primeiras
manifestações do homem primitivo ao juntar um objeto ao outro denota
que o princípio de organização espontânea seria o primeiro passo
para o desenvolvimento da forma e a sua posterior evolução, até
atingir o estágio das atuais sociedades de consumo.
Dentro do processo da comunicação humana, as primeiras manifestações
de comunicação visual esboçam uma tendência natural pela simetria da
natureza e, ao mesmo tempo, uma forte carga de intenções dirigidas
em oposição à linearidade, tendo como resultado as formas
assimétricas. Assim, tanto o Oriente quanto o Ocidente desenvolveram
seus conceitos estéticos à procura de soluções que satisfizessem à
necessidade criadora através do equilíbrio. É nele que encontramos o
ponto central de todo o ordenamento visual.
Allen Hurlburt, estudioso das origens do layout, ao procurar as
raízes da forma e a busca de uma definição da estrutura, afirma:
"Investigando as primeiras manifestações de civilização, os
arqueólogos têm com freqüência encontrado provas e um senso inato de
organização e de um gosto natural pela proporção. Em algumas das
culturas mais primitivas descobriram-se soluções tão complexas que
sugerem o domínio da relação entre a matemática e a forma. Nas
primeiras manifestações conhecidas de comunicação visual há uma
predileção natural pela simetria da natureza; mas ocasionalmente
deparamos também com exemplos de uma forte tensão e formas de
equilíbrio assimétrico". (1980: 51).
As antigas civilizações deixaram provas documentais expressivas e
ainda pouco explicadas em nossos dias. O legado arquitetônico
deixado pelas civilizações grega e romana é o testemunho dessa
predileção do homem pela forma através dos milênios, sem esquecermos
os extraordinários feitos das culturas egípcia, inca e, notadamente,
maia, considerada a cultura que reuniu os mais sofisticados cálculos
matemáticos e sólidos conhecimentos de astronomia.
Com o objetivo de encontrar informações adicionais onde a própria
arqueologia não conseguia desvendar, o norte-americano José
Argüelles, pH.D. em História da Arte e estudioso do fenômeno da
cultura maia amplia seus horizontes além dos territórios delimitados
pelos sítios arqueológicos e faz o seguinte depoimento:
"É evidente que entre as minhas inspirações no ciclo da pintura, ao
qual eu me dedicava, estavam os murais de Teotihuacan, a cerâmica e
os trabalhos hieroglíficos dos maias. O brilho da cor, a capacidade
de transmitir informações através de esculturas simbólicas
condensadas, o desenho geral que reunia muitos aspectos e formas em
um único discurso geométrico, embora ondulante e vibrante, eram
aspectos da arte maia-mexicana que me inspiravam". (1995: 30).
O ideal clássico simétrico, o elemento manifestado pelas primeiras
civilizações ocidentais e o ordenamento assimétrico experimentado
pelas culturas orientais compõem o quadro atual das manifestações
artísticas nos variados campos de atividades e se apresentam como
paradigma que constitui a base e os princípios plásticos, uma função
criadora e de pensamento do homem contemporâneo.
A pintura, a arquitetura, a escultura e as artes gráficas
contribuíram de modo decisivo para o desenvolvimento e o
aprimoramento do moderno layout. As correntes e os movimentos
artísticos no início do Século XX, como uma rede atomizada de novas
informações, desencadearam dentro do processo da comunicação visual
uma série de elementos geradores de idéias que aceleraram o
surgimento de outras manifestações culturais, de um modo especial,
para o desenvolvimento da estrutura e configuração de uma peça
impressa idealizada pelo layout.
Para Allen Hurlburt, o termo layout "é a idéia, a forma, o arranjo
ou composição de uma página impressa" (1980: 8). O caráter
geométrico de sua estrutura e configuração é o elemento condutor do
processo visual e entendido como um fenômeno gestáltico pelas leis
da percepção. Para muitos artistas gráficos ele é encarado como
absoluto, funcionando como produto de uma intuição deliberada que
afasta qualquer tipo de análise ou avaliação. Contudo, é o próprio
paradoxo visual que determina, através da ilusão, a negativa de que
esse processo seja absoluto, uma vez que a percepção visual está
repleta de ambigüidades provocadas entre a retina e o córtex
cerebral, provando que as coisas na verdade não são o que elas
realmente parecem ser.
Gestalt
Os princípios da teoria da Gestalt nos dão a idéia de percepção como
sendo a organização de dados sensoriais em unidades que formam um
todo ou um objeto. Atento às experiências e princípios dessa teoria,
o estudioso do layout e do design da página impressa, Allen
Hurlburt, afirma que essas experiências continuam ainda hoje como a
principal fonte de informação científica sobre percepção e reação.
Para ele, a capacidade do olho e da mente humana em reunir e ajustar
elementos e de entender seu significado constitui a base do design e
nos remete ao princípio que torna possível a confecção do layout de
uma página impressa. E acrescenta: "Os princípios da Gestalt não
apenas ensinam como podemos combinar dados sensoriais para formar
objetos, como também sugerem explicações para o fato de admitirmos a
ilusão da tonalidade criada por pontos de meio-tom, a arte
simplificada dos cartuns, o significado dos símbolos e a inquietação
dos trabalhos abstratos". (1980: 136)
Segundo Kurt Koffka, a psicologia, quando começou a tratar o
problema da percepção, não reconheceu a complexidade de sua tarefa.
Como estudioso da Gestalt, Koffka afirma: "em princípio,
acreditava-se que os diferentes aspectos do mundo visual tinham
origens diversas e independentes, as quais poderiam ser estudadas em
separado. No início, fez-se a distinção entre um sentido de cor e um
sentido de espaço, a que mais tarde se adicionariam o sentido da
forma e, possivelmente, o movimento" (1975: 274). Contudo, melhor
analisando o processo da organização tridimensional essa psicologia
segundo Koffka, "o mundo visual passa a ser visto como um produto de
organização no campo psicofísico e tenta compreender o processo
dessa organização, assim como os fatores que a determinaram. Os
fatos da disparidade retiniana tal como são usualmente enunciados,
são fatos de geometria". (1975: 275 e 276)
O pensamento e os princípios da teoria da Gestalt nos remete para o
conhecimento de que geometricamente cada linha reta que desenhamos é
um retângulo. Psicologicamente sabemos que não o é. Sobre isso Kurt
Koffka nos adverte: "As linhas ordinárias retas ou curvas
apresentam-se como linhas e não como áreas. Têm formas, é certo, mas
faltam-lhes a diferença entre um interior e um exterior" (1975:
160). Para os pensadores das teorias psicológicas da Gestalt, as
coisas que vemos têm melhor forma e estão limitadas por melhores
contornos do que os buracos entre elas, que poderíamos ver, mas não
vemos.
Os defensores dessa corrente psicológica atestam que a Gestalt é um
produto da organização, e a organização é o processo que leva a uma
Gestalt. Koffka afirma ainda: "O processo ou o produto de um
processo é uma Gestalt, o que significa dizer que ele não pode ser
explicado pelo mero caos, a mera combinação cega de causas
essencialmente desconexas; mais que sua essência é a razão de sua
existência". (1975: 691)
Como toda organização perceptual se caracteriza por um processo de
ordenamento dentro de uma estrutura estável, o comportamento oposto
sinaliza para o fato de uma situação instável onde a ação é
prejudicada, uma vez que a postura e o equilíbrio são seriamente
afetados. Desse modo, Koffka salienta: "Não é exagero dizer que,
para nos mantermos de pé, nos apoiamos tanto em nossos olhos como em
nossos pés, ou, talvez melhor, que nos equilibramos contra as
circunvizinhanças, tal como fazemos com as mãos". (1975:399)
Uma página impressa como produto elaborado da nossa percepção é uma
organização: portanto, um fenômeno gestáltico. Nela se destacam os
elementos e princípios básicos dessa corrente da psicologia: suas
leis de percepção das formas, da constância dos objetos, do
princípio do isomorfismo e da teoria da dinâmica de campos. Desse
modo, uma peça impressa constitui um todo visual e seus caracteres
gráficos são vistos de modo globalizante e não por relações
separadas por compartimentos definidos.
O desenho da página impressa tem no layout o seu suporte,
representando com objetividade a síntese de todos os elementos, e
traduzindo com palavras e imagens o seu projeto de forma dinâmica. O
planejamento visual gráfico é o elemento determinante nesse processo
de comunicação, cuja intencionalidade perscruta a percepção e
direciona nos objetivos propostos, no momento de sua criação. Cabe
ao diagramador ou planejador gráfico traçar e decifrar por meio de
códigos e léxicos a sintaxe da página, como instrumento unitário,
dentro de um universo fragmentário de elementos verbais
pré-codificados.
O estudo do desenho contemporâneo revela uma explícita cumplicidade
pelo acúmulo de experiências dos seus precursores, desde a mais
remota Antigüidade. O homem é, por excelência, o árbitro de suas
intenções. Obedece às leis já estabelecidas e desafia com a força do
imaginário um universo simbolizado em ações e reações que avançam e
consolidam o volume do seu repertório.
Max Bense, fundador de uma nova estética, de base semiótica e
teórico-informacional, afirma que "toda concepção e produção
consciente de um estado estético ou de um objeto artístico (que é
portador de um estado estético) parte de um repertório"... (1971:
66). Por outro lado, Lucrécia D'Aléssio Ferrara, interessada na
teoria da linguagem, nos chama a atenção sobre a prática dialógica,
situando a linguagem como prática dos processos de organização do
pensamento, o espaço cultural individual e coletivo e as operações
de seleção e relação que ativam do repertório. Para ela, "a
inter-relação desses elementos caracteriza, para o diálogo, um
volume acionado em três vértices ou em três dimensões: emissor
(agente da escritura), o receptor (agente da leitura) e o contexto
(agente dos processos culturais que se fragmentam no tempo, mas
cujos resquícios permanecem sempre ausentes no espaço da cultura e à
disposição da história)". (1986: 77 e 78)
O estudo do moderno design revela a indiscutível somatória de
conhecimentos das técnicas de reprodutibilidade através da
tipografia, da arquitetura, do desenvolvimento tecnológico e
industrial e do próprio grafismo, em perfeita sintonia com os
movimentos artísticos da pintura e da escultura. Há, na verdade, um
crescimento paralelo de idéias em todas as áreas e uma necessidade
de compartilhar das experiências adquiridas em busca de novos
desafios na divisão do espaço.
No século XVI, a concepção do tradicional desenho bidimensional,
representada pelo mapeamento do mundo por Mercator, está
caracterizada por uma visão sem o sentido da tridimensionalidade das
esferas e do grafismo contemporâneo do século XX. Nesse século, o
inventor e arquiteto Buckminster Fuller cria o que é hoje
universalmente conhecida como a representação do mundo: o globo
geodésico.
O moderno desenho de uma página impressa tem como objetivo reunir os
elementos gráficos dominantes e secundários caracterizados pela
tipologia, ilustrações, legendas, espaços em branco, o texto
escrito, que através de sua estrutura e configuração traduzem a
intencionalidade do que se deseja comunicar. A utilização de
elementos geométricos funciona como elo entre o artista e o
observador, agindo sobre a percepção através do sistema sensorial
orientado por estímulos, o que resulta em uma cumplicidade
recíproca, redundando em um eficiente processo de comunicação.
No princípio do século XX, várias correntes artísticas influenciaram
de maneira marcante e contribuíram para o desenvolvimento do layout
até às publicações dos dias atuais. As linhas geometrizantes do
cubismo alinhadas às idéias construtivistas e abstracionistas de
outros movimentos artísticos de igual relevância enriqueceram o
desenvolvimento e o aprimoramento do moderno design da página
impressa. Essas idéias básicas são analisadas por E. O. H. Gombrich:
"O interesse na estrutura, suscitado pelo cubismo entre os pintores
em Paris, na Rússia e logo na Holanda com a seguinte questão:
poderia a pintura converter-se numa espécie de construção, como a
arquitetura?... O Cubismo não se propunha abolir a representação,
apenas queria reformá-la". (1993: 452 e 464)
Vanguardas Artísticas
A forma ganha novo impulso com o Cubismo. Sua característica
marcante é apresentar o objeto significante sob vários ângulos.
Apresenta nos seus traços, a frente e as costas, o que está dentro e
fora, o acima e o abaixo, com o objetivo de desmistificar a ilusão
da perspectiva linear, para uma representação simultânea da
totalidade do objeto representado. "O Cubismo substitui o 'ponto de
vista', ou faceta da ilusão perspectivista, por todas as facetas do
objeto apresentadas simultaneamente" (McLuhan, 1971: 27). McLuhan
nos chama a atenção para o fato de que, ao propiciar a apreensão
total instantânea, o Cubismo reafirmou a idéia de que o meio é a
mensagem. Em outras palavras, esclarece: "O Cubismo, exibindo o
dentro e o fora, o acima e o abaixo, a frente, as costas e tudo
mais, em duas dimensões, desfaz a ilusão da perspectiva em favor da
apreensão sensória instantânea do todo" (1971: 27). Enfim, o Cubismo
teve como principal função acentuar a leitura integral do objeto
representado.
O movimento cubista não apenas rompeu com o comportamento do plano
tridimensional da pintura, mas, sobretudo, resgatou a sua forma
bidimensional, mostrando o objeto sob vários ângulos,
simultaneamente, determinando forte influência no desenho da página
impressa. Allen Hurlburt observa que "a revolucionária concepção
formal desse movimento, arma todo o cenário para o desenvolvimento
do moderno design, abrindo novas possibilidades para a evolução das
Artes Gráficas, com reflexos diretos no futuro da página impressa".
(1980:18 e 19)
Se por um lado o Cubismo quebrou todas as formas convencionais da
arte e do desenho, outros movimentos de expressiva carga
revolucionária avançaram nesse sentido durante as três primeiras
décadas do Século XX, deixando marcas indeléveis nos mais variados
segmentos das artes visuais. O Futurismo, a Art Nouveau, a Art Déco
e o Surrealismo fazem parte desse processo de mudanças de
comportamento, com dupla fertilidade de ideais artísticos, que de
alguma maneira deixaram uma contribuição ideológica para o
aprimoramento do próprio desenho.
Quebrando todos os conceitos tradicionais, o movimento dadaísta, de
vida relativamente curta (1912 - 1922), tenta revitalizar as artes
visuais, rompendo com os conceitos tradicionais da arte e derrubando
toda a estrutura da representação racional. O seu principal objetivo
era protestar e rejeitar todos os valores instituídos pelas artes e
pela sociedade. Na visão de Walter Benjamin, o comportamento social
provocado pelo Dadaísmo foi o escândalo, isto é, que suas
manifestações asseguravam uma distração intensa, transformando a
obra de arte no centro de um escândalo. E ainda acrescenta: "O
Dadaísmo colocou de novo em circulação a fórmula básica da percepção
onírica, que descreve ao mesmo tempo o lado tátil da percepção
artística: tudo o que é percebido e tem caráter sensível é algo que
nos atinge". (1985: 191 e 192)
Oriundo de artistas remanescentes de outros movimentos, e de obras
como "Nu descendo uma escada" e "Roda de bicicleta", de Marcel
Duchamp, com características e atitudes anticonvencionais, o
Dadaísmo tem vida curta e volta a renascer em Nova Iorque, no século
passado, final dos anos 50 e início da década de 60, nas obras de
Andy Warhol, com as caixas Brillo, e de Cleas Oldenburg, em telefone
Limp, como uma variação da obra de Duchamp.
Em Iniciação à História da Arte, H. W. Janson salienta que o francês
Marcel Duchamp lançou o movimento denominado "Dadá" (Dadaísmo). O
termo francês, que significa cavalinho de pau, foi, segundo se
conta, encontrado em um dicionário por acaso, mas como se trata de
uma palavra infantil... Janson ainda observa: "O Dadaísmo tem sido
chamado de niilista, e seu objetivo era, na verdade, deixar claro ao
público que todos os valores estabelecidos, morais e estéticos
haviam perdido seu significado em decorrência da Primeira Guerra
Mundial. Durante sua breve vida de 1916 - 1922, o Dadaísmo pregava
veementemente o absurdo e a antiarte"... (1988: 380)
A obra Dadá-Berlim - Des/Montagem, de Norval Baitello Jr. nos remete
ao universo irreverente e contestador desse movimento cultural de
curta duração, cujos registros ficaram gravados nos jornais, nas
revistas e tipografia caótica de suas mensagens, parodiando,
montando e desmontando o antigo e o novo, em busca do inusitado, a
desordem. Para Norval, essa noção de desordem e desuniformidade
"estão ligadas ao conceito de não-definitivo, para as normas
culturais contemporâneas... A grafia é sinal de perene, em oposição
ao oral, ao apenas dito, que se perde no espaço-tempo. Pois a
tipografia de Dadá anuncia o elemento da desordem, 'descoordenação
motora', desacreditando o tipográfico, instaurando por assim dizer
uma oralidade tipográfica". (1993: 101 e 118)
O rompimento com o tradicional fez do Dadaísmo um escudo de idéias
contestadoras, desencadeando ações e reações que levaram ao
surgimento de novas concepções sobre a forma, a exemplo da moderna
pintura de Piet Mondrian, geométrica, de arrojada concepção
espacial, com permanente influência no desenho da página impressa.
"O Dadaísmo influiu nos designers gráficos de duas maneiras
igualmente importantes: ajudou-os a se libertarem das restrições
retilíneas e reforçou a idéia cubista do uso da letra em si mesma
como uma experiência visual... Despertou também os designers para o
fato de que o chocante e o surpreendente podem representar um
importante papel na superação da apatia visual". (Hurlburt, 1980:
23)
De qualquer modo, o Dadaísmo e suas idéias revolucionárias no
combate impiedoso ao que estava estabelecido pelas manifestações
artísticas até o início do Século XX deixaram seguidores e
espalharam influências nos mais variados movimentos da criação
artística, notadamente a linha dos construtivistas da Escola de
Bauhaus e do grupo denominado De Stijil, que lhe deram ordenamento
ao caos instituído, pelo sentido de ordem e pela objetividade,
abrindo maiores oportunidades para o desenvolvimento do moderno
design e de nova estruturação de layout para a página impressa.
Segundo Allen Hurlburt, à época em que a Escola Bauhaus encerou suas
atividades, em 1993, o moderno desenho era uma idéia plenamente
desenvolvida:
"A arquitetura evoluiu para o estilo internacional e o design
industrial tornou-se uma nova forma artística, baseada nas
estruturas estabelecidas nas oficinas Bauhaus. No desenho gráfico, a
assimetria estava firmemente instituída; a tipografia havia
encontrado novas expressões, diretas e simples; e a crescente
importância da publicidade era um fato incontestável, a partir da
criação dos cursos de propaganda do Bauhaus, ao final da década de
20. O movimento moderno colocou uma nova ênfase nas cores primárias
- vermelho, amarelo e azul - bem como nas formas primárias -
quadrado, círculo e triângulo". (1980: 42)
A importância do movimento Bauhaus para o desenvolvimento do desenho
é retratada por Magdalena Droste, quando afirma:
"As aulas de Paul Klee tinham como tema as formas elementares,
passando posteriormente para as cores elementares. Muitos dos
exercícios conhecidos hoje derivaram destas formas. Estas
encorajavam o sentido pela organização dos espaços e abriram a visão
para as infinitas possibilidades do design: através da proporção,
rotação, de reflexões em conjunto com exercícios sobre a teoria da
cor, oferecia-se um campo de atividade inesgotável". (1992: 65)
Droste relata a importância do ateliê de tipografia e publicidade da
Escola Bauhaus, onde o esboço e a execução realizavam-se sob um
único teto, isto é, tornar possível estruturar as condições prévias
para uma nova descrição do trabalho: o desenho gráfico. (1992: 148)
Entre os elementos da composição do moderno design, Magdalena Droste
ainda lembra que, "estilisticamente falando, o atelier utilizava
agora a 'nova' ou 'elementar' tipografia que Lucia Moholy
introduzira na Bauhaus. O vermelho e o preto eram as cores
dominantes, outros elementos de composição incluíam letras, tipos
sem serifa, grotesca, o que mais tarde se juntou ao estilo futura,
trabalho com fotografias e material tipográfico como pontos, linhas,
travessões e retículas. O ordenamento do plano respeitava agora as
regras de simetria mais o significado do texto, e podia ser diagonal
ou vertical". (1992: 151)
Todos os movimentos das vanguardas artísticas do início do Século XX
contribuíram de algum modo para o desenvolvimento e para o
aprimoramento do desenho. Essa importância é demonstrada pelas
afirmações de Giulio Carlo Argan, quando ressalta:
"As vanguardas são um fenômeno típico dos países culturalmente menos
desenvolvidos e apresenta-se como rebelião contra a cultura oficial
geralmente moderada, aproximando-se dos movimentos políticos
progressistas. Seus esforços, embora intencionalmente
revolucionários, em geral reduzem-se a um extremismo polêmico. Nos
manifestos futuristas, pede-se a destruição das cidades históricas e
dos museus; exalta-se a cidade nova concebida como uma imensa
máquina em movimento. A revolução que se deseja é, na verdade, a
revolução industrial ou tecnológica, isto é, ainda uma revolução
burguesa; na nova civilização das máquinas, os intelectuais-artistas
deverão representar o impulso espiritual do 'gênio'". (1995: 313)
O que se pode ressaltar é que estas correntes não se excluem entre
si, mas de alguma maneira se inter-relacionam de tantos modos, que a
produção artística se integra em duas ou mais, num processo de
continuidade, desdobramentos e contraposições. Um exemplo claro
dessa dualidade é revelada por Argan:
"Literalmente, expressão é o contrário de impressão. A impressão é
um movimento do exterior para o interior: é a realidade (objeto) que
se imprime na consciência (sujeito). A expressão é um movimento
inverso, do interior para o exterior: é o sujeito que por si imprime
o objeto. É a posição oposta à de Cézanne, assumida por Van Gogh.
Diante da realidade, o Impressionismo manifesta uma atitude
sensitiva, o Expressionismo (sic) uma atitude volitiva, por vezes
até agressiva... Somente a primeira (a tendência expressionista)
coloca o problema da relação concreta com a sociedade e, portanto,
da comunicação; a segunda (a tendência simbolista) o exclui,
coloca-se como hermética ou subordina a comunicação ao conhecimento
de um código (justamente o símbolo) pertencente a poucos iniciados".
(1995: 227). Contudo, ainda explica Argan: "Na poética neoplástica,
o puro ato construtivo é estético: unir uma vertical a uma
horizontal ou duas cores elementares já é construção". (1995: 287)
Geometrização
A importância do movimento cubista não apenas se limitou ao
desenvolvimento do layout, mas a outras correntes artísticas,
conforme observa H. W. Janson: "O Cubismo espalhou-se por todo o
mundo ocidental e influenciou não só outros pintores, como também
escultores e até arquitetos" (1992: 684). E ainda acrescenta: "O
Cubismo era uma disciplina formal do equilíbrio sutil, aplicada a
assuntos tradicionais tais como naturezas-mortas e nus. No entanto,
outros pintores encontraram-lhe uma afinidade especial com a
precisão geométrica da engenharia, considerando-o especialmente
adequado ao dinamismo da vida moderna". (1992: 686)
A contribuição do pintor holandês Piet Mondrian, em princípio do
século XX, é um dos exemplos dos rumos tomados pelo moderno layout,
quando propõe o quadro como produto industrial equivalente aos
outros elementos da cultura de massa já instituídos pela moderna
tecnologia. Em suas figuras geométricas representadas por retângulos
e quadrados, envolvidas por combinações assimétricas e uso das cores
primárias - vermelho, azul e amarelo -, tenta alcançar o equilíbrio
entre o objetivo e o subjetivo, isto é, a formalização direta da
beleza universal e a sua expressão estética em si mesma.
Como teósofo convicto, Mondrian tenta captar uma realidade concreta
que estaria além das variações da percepção individual. Em sua obra,
a utilização de formas geométricas leva o observador à constatação
da existência de quadrados, revelando a densidade de cada
superfície, pela utilização das cores e sobreposição das formas
geometrizadas. Foi considerado o mais radical abstracionista do
nosso tempo e um dos pintores que mais contribuiu para o
desenvolvimento do desenho.
Essa importância de Mondrian é revelada por H. W. Janson quando
afirma: "Desenvolveu um estilo completamente não-figurativo que
chamou de neoplasticismo, também conhecido por De Stijil, nome da
revista holandesa que defendia suas idéias. Seu desenho está
reduzido a traços horizontais e verticais, às cores dos três tons
primários e ao preto e o branco. Qualquer possibilidade de
representação ficou eliminada e a sua obra também não faz sentido
numa reprodução em preto e branco". (1992: 689)
Numa análise sobre as linhas geométricas e composição das cores do
trabalho de Mondrian, Janson observa:
"Ao analisar a composição em vermelho, azul e amarelo, verificamos
que, medindo as várias unidades, apenas as proporções da tela são
verdadeiramente racionais - um quadrado exato. Mondrian conseguiu
todo o resto por intuição e tentativas. Quantas vezes teriam ele
modificado as dimensões do retângulo vermelho para adquirir o
equilíbrio entre este e o restante dos elementos? Por estranho que
pareça, o apurado sentido de equilíbrio não-simétrico de Mondrian é
tão característico que críticos bem familiarizados com a sua obra
não têm dificuldade em distinguir um quadro autêntico de uma
falsificação. É provável que sejam os desenhadores que lidam com
formas não figurativas, tais como arquitetos e topógrafos, os que
mais apreciam esta sua faceta, e, na realidade, Mondrian teve sobre
eles uma influência maior do que sobre os pintores". (1992: 689)
Em sua última fase criativa, a característica neoplasticista de
Mondrian através da utilização de linhas horizontais e verticais e o
estilo geometrizado de suas obras revelam uma perfeita sintonia com
a funcionalidade da arquitetura, com o urbanismo das cidades e com o
próprio grafismo das modernas peças gráficas da publicidade
contemporânea. Através da ousadia e da inovação dos seus trabalhos,
mistura a pureza e a simplicidade traçadas na superfície
bidimensional de suas obras, comprovando a significativa influência
desse artista, na pesquisa do moderno layout e no aprimoramento das
investigações da estrutura e configuração do espaço bidimensional.
Mondrian formula plenamente seu neoplasticismo baseando-se na
estruturação de linhas retas e cores primárias, alternadas com zonas
brancas. Sua participação no grupo artístico De Stijl o influenciou
na continuidade do seu trabalho com características geométricas
marcantes, onde formas quadradas e retangulares delimitam as zonas
cromáticas. Não resta a menor dúvida de que a fonte mais citada como
origem da moderna arte gráfica é o Cubismo. Contudo, outras
correntes artísticas de igual ou relativa importância influenciaram
o desenvolvimento do desenho moderno.
Embora vários estudiosos do desenvolvimento do moderno layout
sinalizem em direção à influência dessas correntes artísticas no
avanço técnico do design de uma página impressa, não seria o jornal
um produto industrial acabado que teria assumido esse papel, num
sentido inverso? Não há uma resposta definitiva. Sendo um veículo de
comunicação massiva, com um poder infinitamente maior de penetração
e, portanto, de manipulação, a página de um jornal reuniria as
condições básicas para efetivar essa transformação.
Com o desenvolvimento da reprodutibilidade técnica, a tipografia
leva a imprensa a mudanças radicais. É pelo layout das páginas que o
jornal reflete através dos textos e ilustrações organizados em
arranjos espaciais, a visão do mundo. De modo mais acentuado que a
pintura, é a página de jornal que expressa essa nova realidade do
homem transformado nos centros urbanos, presa aos caprichos impostos
pela industrialização. Sob o ponto de vista cultural é perfeitamente
possível confrontar a edição jornalística com a produção artística,
pois o fenômeno se ramifica por todos os setores da arte e da
própria cultura. Se por um lado as correntes impressionista e
expressionista deflagraram uma nova visão da realidade formal, o
layout de uma página de jornal ou de um cartaz publicitário, como
elemento da cultura de massa, pode ser caracterizado como um modelo
expressivo da moderna arte industrial.
Percepção
Dentro do processo da comunicação visual, a intencionalidade da
mensagem se baseia em fundamentos culturais, que pressupõem uma
forma de operação. Praticamente tudo que os nossos olhos vêem pode
ser interpretado como um processo de comunicação visual. Bruno
Munari, em sua obra Design e Comunicação Visual, nos chama a atenção
para o fato de que dentro do processo da comunicação visual existem
dois componentes fundamentais: a informação e o suporte. Segundo
ele, "a arte é um fato mental, ligado ao conhecimento das coisas e
dos meios da comunicação visual. As coisas não são mais do que a
realidade na qual todos vivem, os meios são instrumentos que
permitem tornar visível aquilo que o cérebro capta a partir dos
estímulos externos". (1968: 75 e 76 )
No âmbito da comunicação visual, Munari ainda observa que no
processo intencional a informação se direciona em dois caminhos: o
da informação estética e o da informação prática. E assim explica:
"Como informação prática, sem componente estético, entende-se, por
exemplo, um desenho técnico, a fotografia do repórter, as notícias
visuais da TV, um sinal de trânsito, etc. Como informação estética,
entende-se uma mensagem que nos informe, por exemplo, as linhas
harmônicas que compõem, numa forma, as relações volumétricas de uma
construção tridimensional, as relações temporais visíveis de
transformação de uma forma noutra. Assim, cada receptor e cada um de
modo diferente, possui algo que podemos definir como filtros,
através dos quais a mensagem terá de passar para ser recebida".
(1968: 87 e 90)
Uma página impressa, em princípio, é uma grande massa. Forma e
conteúdo provocam um exercício de Gestalt. O fenômeno é corriqueiro
e pode ser observado por qualquer pessoa numa banca de jornais. Uma
grande manchete, uma fotografia, espaços em branco e grandes áreas
negras preenchidas por tinta. Preto e branco. De repente, a cor.
Esta, mais envolvente, atuando de forma persuasiva e atraindo para
si todo o centro da percepção planejada. Mas não é apenas isso. Há
contornos, fios grossos e finos, quadrados, retângulos, a própria
linha. Um ponto. Este, o elemento catalisador do movimento ótico, o
princípio e o fim dos ditames visuais mais importantes a serem
traçados na página.
O desenho da página impressa representa, na verdade, uma
configuração indicial e, ao mesmo tempo, contempla o leitor por meio
de uma série de ícones em códigos específicos, definindo o que a
mensagem representa, ou o que se deseja comunicar.
"A página impressa possui uma qualidade especial que influencia sua
forma, seu conteúdo e a reação do leitor"... "Perceber uma imagem é
participar de um processo criativo. No ato de ver, temos a tendência
de separar determinadas imagens da massa de impressões a que estamos
expostos e adicionar a essa imagem nosso próprio conhecimento, nossa
experiência e imaginação". (Hurlburt, 1980: 133)
Num trabalho de Lúcia Santaella sobre a percepção são realçadas as
pesquisas empíricas realizadas sobre o assunto, revelando que,
provavelmente, devido às condições evolutivas do ser humano, 75% da
percepção humana é visual. A segunda em importância cabe ao ouvido,
com 20 %, e aos demais sentidos representados pelo olfato, paladar e
tato, 5%. Fica evidente o domínio absoluto do sentido visual como
elemento mediador das atividades do homem.
Santaella salienta que a visão é o sentido mais importante e foi
sobre ela que os estudiosos redobraram suas pesquisas. "A primeira
dificuldade a ser enfrentada dizia respeito à óbvia disparidade
entre a imagem retiniana que é plana, chapada e a percepção visual
dos objetos do mundo, que é tridimensional". (1993: 24 e 25).
Numa página impressa, o texto escrito transmite a informação através
dos seus signos compreensíveis: as palavras. Ao mesmo tempo, produz
uma informação visual de reforço estético através dos símbolos que
atuam na sensibilidade do receptor. Aí vemos como o discurso gráfico
assume sua condição de linguagem. Suas raízes se findam no
planejamento visual estruturado pela diagramação, mecanismo de
linguagem que traduz em códigos e léxicos o que se deseja comunicar.
No desenvolvimento do desenho de uma página, o grafismo é um dos
elementos indispensáveis de apoio ao texto. Com a utilização de uma
diagramação moderna e envolvente, o desenho da página deve
acompanhar o desenvolvimento da tecnologia gráfica e dos novos
conceitos estéticos do texto escrito. Embora a tipografia moderna
esteja assentada nas teorias e princípio do desenho desenvolvido nos
anos vinte e trinta do Século XX, devemos aos pesquisadores da
tipografia objetiva e funcional e do desenho gráfico o
desenvolvimento de sistemas reguladores da comunicação visual até
nossos dias.
O grafismo é o elemento regulador de uma ação e reação no âmbito da
página impressa. É nele que se concentra o poder de sedução e a
identidade visual de uma publicação. Nesse sentido, Josef
Müller-Brockmann nos adverte:
"A concepção da identidade visual tem que ser planejada para todos
os meios de informação... Deve procurar-se uma idéia básica que
permita encontrar respostas consistentes, lógicas e funcionais aos
problemas que surjam mas ao mesmo tempo deve (sic) ir mais longe...
A concepção de uma identidade visual deve apresentar uma grande
flexibilidade de tal forma que corresponda a funções de comunicação
ainda desconhecidas, devendo criar sempre um sentido de interesse e
inovação"... (1982: 133)
A primeira página de uma publicação é a vitrina onde deverão estar
expostos os principais elementos informativos que se deseja
comunicar. Nela são traçadas as estratégias de sedução de leitura,
onde o grafismo contido de forma harmoniosa desperta esse interesse,
de acordo com os critérios utilizados pelos planejadores gráficos.
Um dos mais requisitados planejadores gráficos de jornais da
atualidade, Mario R. García, salienta:
"Os desenhadores de jornais devem reconhecer a importância do
movimento do olho quando desenham uma página, especialmente, na
primeira página, quando a atração inicial antecede a qualquer outra
ação por parte do leitor. E para atingir esse objetivo, devem estar
atentos a duas regras básicas: captar a atenção do leitor no momento
em que vê a página e criar o interesse visual necessário para que os
olhos do leitor não desistam de vê-la". (1984: 56)
O efeito gestáltico provocado pela compartimentação modular dos
textos escritos, fotos, gráficos e outros elementos, em espaços
prefixados e padronizados, tornou irreversível a industrialização do
design das páginas. A evolução tecnológica é o agente transformador
das mentalidades. Tanto no jornalismo impresso diário, quanto na
moderna arte publicitária, essa transformação abre novos caminhos de
comportamento. A técnica impõe novas práticas, que levam a outros
padrões estéticos.
Considerado como um dos pioneiros a abandonar as normas da
tipografia tradicional, e um dos principais conhecedores das Artes
Gráficas da atualidade, Emil Ruder acredita que o espaço sobre o
papel nunca significou simplesmente uma superfície sem vida a cobrir
com elementos tipográficos. Persegue a magia da tridimensionalidade,
como homem do seu tempo, acompanhando, com naturalidade, as mudanças
impostas pela tecnologia. Para ele: "o desenhador-tipográfico deve
manter-se ao corrente da evolução técnica presente e futura, já que
tais progressos podem ao mesmo tempo criar modificações formais. E
em cada obra impressa que pretenda ser um testemunho válido da sua
época, as qualidades técnicas devem aparecer unidas às qualidades
formais". (1983: 58)
Assim, o avanço tecnológico e a utilização cada vez mais crescente
da informatização das redações nas corporações jornalísticas e nas
agências de publicidade, além do aumento vertiginoso de atrativos
visuais inter-relacionados (desenho/máquina) são fatores que exigem
novas posturas de comportamento. A paginação eletrônica atinge
níveis técnicos satisfatórios compatíveis ao desenvolvimento de um
modelo de desenho gráfico industrial capaz de acelerar a relação
espaço-tempo de produção da informação. Há uma emergente mudança nos
processos tátil e mental, na confecção de uma peça impressa. Isso
leva a alterações na anatomia dos veículos impressos que, a cada
dia, tentam se adequar ao novo e disputar um mercado em constante
transformação.
Contudo, a concorrência da mídia eletrônica, em especial a
televisiva, acelera esse processo de atualização tecnológica do
jornalismo impresso diário, cuja finalidade básica é a sedução dos
leitores e a busca de novos mercados. E uma das armas principais
utilizadas para essa sedução é o uso da cor. O surgimento e a
difusão da cor na televisão alteram decisivamente a expressão
plástica uniforme e acinzentada dos jornais do mundo inteiro.
Colorização
Dentro do processo da comunicação visual, o homem diante da cor
recebe uma influência tríplice: a de impressionar, a de exercer e a
de construir. Modesto Farina, estudioso da teoria das cores, explica
esses fenômenos:
"Quando a cor é vista, impressiona a retina. Quando é sentida,
expressa, provoca uma emoção. E é construtiva, pois tem um
significado próprio, tem valor de símbolo e capacidade, portanto, de
construir uma linguagem que comunique uma idéia... Na realidade, a
cor é uma linguagem individual. O homem reage a ela subordinado às
suas condições físicas e às influências culturais". (1982: 27)
Em relação a esse processo, os tons e semitons do cinza e o
contraste agressivo das áreas negras no papel em branco foram, por
muito tempo, os únicos elementos da cor utilizada na produção
gráfica, pelo jornalismo impresso diário. As dificuldades técnicas e
a inviabilidade econômica de sua reprodução inibiram o uso da
policromia. Contudo, a concorrência com outros veículos impressos
tais como revistas, cartazes, embalagens e, principalmente, com o
advento da televisão em cores, a mídia impressa diária mudou
comportamentos e estabeleceu novos valores e padrões visuais,
inclusive o uso da cor.
Os desenhistas gráficos de jornais precisaram se adaptar a essa nova
realidade com o uso da policromia no seu dia-a-dia de trabalho. O
domínio técnico para essa atividade é fundamental, para que a
produção gráfica se processe de modo harmônico no seu resultado
final, que é a página impressa.
Modesto Farina nos adverte que os costumes sociais são fatores que
intervêm na escolha das cores, e que derivando de hábitos
estabelecidos durante longo espaço de tempo, fixam-se atitudes
psicológicas que orientam inconscientemente inclinações individuais.
Para ele, "a cor é uma realidade sensorial à qual não podemos fugir.
Os vários processos de que se ocupa o fenômeno do cromatismo além de
atuarem sobre a emotividade humana, produzem uma sensação de
movimento, uma dinâmica envolvente e compulsiva". (1982: 101)
A conceituação da cor, segundo Rudolf Arnheim, relaciona-se com o
desenvolvimento cultural dentro de uma relação de obscuridade e
claridade. Assim, ele define:
"Estritamente falando, toda aparência visual deve sua existência à
claridade e cor. Os limites que determinam a configuração dos
objetos provêm da capacidade dos olhos em distinguir entre áreas de
diferentes claridades e cor. Isto é válido mesmo para as linhas que
definem as configurações em desenhos; elas são visíveis apenas
quando a tinta difere do papel, na cor. Não obstante, pode-se falar
de configuração e cor como fenômenos separados. Um disco verde sobre
um fundo amarelo é exatamente tão circular quanto um disco vermelho
sobre um fundo azul (sic) e um triângulo preto é tão preto quanto um
quadrado preto". (1980: 323).
Em termos gerais, para Arnheim, na visão da cor a ação parte do
objeto e afeta a pessoa; mas quanto à percepção da forma, a mente
organizadora vai ao encontro do objeto. Para ele, uma aplicação
literal dessa teoria "poderia levar à conclusão de que a cor produz
uma experiência essencialmente emocional, enquanto a forma
corresponde ao controle intelectual". (1980: 326 e 327)
Forma e conteúdo, cor e movimento, elementos presentes em todas as
atividades do homem contemporâneo são, segundo Pierre Francastel,
"as bases de um novo sistema figurativo, apoiado numa nova
apreciação da natureza física das cores, bem como numa nova
apreciação da natureza signo plástico (1983:210. Para ele, "a nossa
época cria cor, da mesma forma que cria tudo que nos cerca. O homem
espectador e explorador é substituído pelo homem artesão e criador
do seu universo; com melhores ou piores resultados, a especulação
moral cede passo à criação ativa de meio de ação do homem sobre a
natureza, cada vez mais poderoso. A cor é um dos instrumentos mais
presentes nessa rápida criação de um novo ambiente para a espécie
humana". (1983: 220)
No desenvolvimento do design, o problema da cor possui dois aspectos
na posição de Bruno Munari: como usar o material, já colorido, que a
indústria produz e com que critério inserir o elemento cor no
projeto dos objetos. Para ele, "a cor não tem a mesma função para o
designer e para o pintor. O designer opera em ligação com a ciência
e a indústria, o pintor tem relações com o artesanato e com a
produção manual. O designer tem que usar a cor de modo objetivo
(sic) enquanto o pintor, (sic) usa-a, de modo subjetivo". (1968:
362)
Quando se trata de imagens coloridas, o estudioso do layout Allen
Hurlburt alerta que os desenhistas devem considerar tanto os
contrastes cromáticos como os de valor. E acrescenta: "O contraste
se verifica entre as cores de alta intensidade; entre cores frias
(azul e verde) e cores quentes (vermelho e amarelo); e na
justificação deliberada de cores complementares (que não combinam).
Cores complementares são as que, num círculo cromático, se encontram
opostas uma à outra". (1980: 65)
Embora tardiamente, a chamada grande imprensa brasileira despertou
para o uso da cor, trazendo com ela mudanças comportamentais tanto
por parte do seu público quanto pela área técnica especializada da
produção gráfica. Diagramadores desenvolvem o layout para essa nova
realidade em que a cor determina as novas regras do jogo. O grafismo
se avoluma e se aperfeiçoa, em busca de novos elementos que
identifiquem a publicação com o seu público consumidor.
É importante salientar que na classificação das cores há diferenças
entre a cor-luz e a cor-pigmento. O vermelho, o verde e o
azul-violeta são as cores primárias da luz; enquanto o azul (cian),
o vermelho (magenta) e o amarelo pertencem às cores primárias da
cor-pigmento. Se por um lado as leis da ótica determinam a cor-luz -
como, por exemplo, a fotografia -, por outro, a reprodução dessa
imagem impressa através da química (tinta) num suporte de papel é
determinada pela cor-pigmento transparente, ou por transparência em
retículas, quando essas cores primárias são representadas pelas
cores compostas denominadas cian (azul), magenta (vermelho) e
amarelo.
Apesar do efeito persuasivo da cor, Leon Kossovitch nos chama a
atenção para o fato de que os conceitos de luz e sombra prevalecem
sobre o de cor, uma vez que a exposição da cor é menos detida que a
do desenho, visto que a ele está subordinada, sobressaindo à
seqüência comum: desenha-se, depois se colore. E ainda acrescenta:
"A cor vem analisada principalmente no conceito abrangente de
recepção de luzes, que, com os de distância e ângulo do olhar,
definem as qualidades variáveis; as permanentes, 'perpétuas', isto
é, as linhas de contorno e seus ângulos, definem a superfície como
tal, excluído o olhar. São variáveis as qualidades que, não
pertencendo à superfície, modificam-na; assim recepção de luzes, por
um lado, e o ângulo e a distância, por outro, qualificam a
superfície como aparência. A incidência de luz e o sítio do olhar
configuram, respectivamente, o construto perspectivista e o
claro-escuro". (1995: 184)
No estudo "A emancipação da cor", de Leon Kossovitch, ele assinala
que o branco e o preto traduzem a luz e a treva; os matizes, a
sombra: "Nas coisas, luz e treva são recíprocas, sendo a sombra a
diminuição da luz, no que distingue a escuridão... É que o branco
participa em economia relevante, que extrapola os conceitos, até
certo ponto estabelecidos, de relevo; luz e sombra montam com as
cores sistema de interações óticas, cujo princípio é a
reflexividade". (1995: 189)
De acordo com a explicação dada por Milton Ribeiro sobre a luz e a
cor,
"a luz se compõe de uma mistura de radiações de diferentes
longitudes de ondas. A mistura uniforme e simultânea de todas estas
ondas produz em nós a percepção do branco; o que indica que a luz
colorida é uma parte da luz branca... A luz provém de uma fonte
natural ou artificial. Cada fonte, ou centro luminoso, emana ondas
ou vibrações que impressionando a vista dão precisamente a sensação
de luz. Tais ondas e vibrações têm sua própria longitude ou
freqüência, que por serem diferentes resultam em cores diferentes.
Então, a luz que convencionalmente chamamos branca é o resultado da
combinação de muitos raios coloridos, dos quais a vista humana
percebe somente uma parte". (1983: 151)
A difusão e o uso da cor pelos veículos de comunicação de massa
impressos, ou nas artes visuais de um modo geral, não se limitam
apenas ao valor decorativo, tampouco ao meramente estético. Não deve
ser encarada apenas como um recurso, mas, acima de tudo, como um
procedimento de linguagem e de expressão. Em termos gerais, Rudolf
Arnheim explica que "na visão da cor a ação parte do objeto e afeta
a pessoa; mas para a percepção da forma a mente organizadora vai ao
encontro do objeto" (1980: 326). "A cor produz uma experiência
essencialmente emocional, enquanto a forma corresponde ao controle
intelectual." (1980: 327)
O homem urbano é bombardeado diariamente por uma enorme carga de
mensagens visuais. Essas mensagens que roubam o olhar do receptor,
informando e seduzindo, têm na cor o elemento centralizador desse
comportamento. A ótica e a neurofisiologia explicam desde o passado
até o presente a percepção desse fenômeno.
A difusão do uso da cor no jornalismo impresso diário vem se
desenvolvendo rapidamente. Um dos responsáveis por esse procedimento
é o próprio avanço tecnológico e, sobretudo, a concorrência da
imagem televisual. O poder de influência da televisão sobre o
jornalismo impresso é que vai determinar essa mudança de
comportamento no mercado da informação. O veículo TV propiciou uma
agilidade receptiva que acabou criando uma nova estética, por meio
dessas possibilidades de metamorfose visual, que hoje o jornalismo
impresso possui.
É no moderno design e na atualização tecnológica que o jornalismo
impresso diário parte em busca de novos caminhos, segmentando
assuntos específicos em cadernos e favorecendo o trabalho do
marketing publicitário, num procedimento semelhante ao conquistado
pelas revistas e pela própria televisão.
A sedução visual é o suporte para esse novo tipo de marketing
jornalístico, garantindo a sustentação econômica das corporações
jornalísticas, quando provoca novos estímulos de leitura.
Atraído por esse jogo sedutor, o leitor é envolvido pela página
impressa sem perceber que se inseriu em um complexo mercadológico.
Essa é a magia do grafismo enquanto linguagem. É quando um meio se
transforma em mensagem.
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Rafael Souza Silva é doutor em Comunicação e Semiótica (PUC/SP);
mestre em Ciências da Comunicação (ECA/USP); professor do Programa
de Mestrado em Comunicação - UniSantos; diretor e professor-titular
da Faculdade de Comunicação - UniSantos e jornalista.
Fonte: GHREBH - http://revista.cisc.org.br