A Meta
Por Tom Coelho
19/04/2003
“A fórmula da minha felicidade:
um sim, um não, uma linha reta, um
objetivo.”
(Friedrich Nietzsche)
Você decide ir ao cinema. Sai de casa e
quando percebe, imerso em seus
pensamentos, está fazendo o caminho
convencional para ir ao trabalho – e que
coincidentemente é diametralmente
oposto. Depois de enfrentar um belo
trânsito, acerta o passo e chega ao
shopping. Vasculha os três pisos para
obter uma vaga no estacionamento. Logo
mais, encontra uma agradável fila para
comprar os ingressos. Na boca do caixa
descobre que a sessão está esgotada.
Outra, só duas horas e quinze minutos
depois.
Impossível? Improvável? Com você não?
Pense bem antes de responder. Se você
ainda não passou pelo ciclo completo
descrito acima, uma boa parte dele já
lhe visitou num final de semana destes.
O mal é o mesmo que afeta profissionais
e empresas no mundo corporativo: a
ausência de metas definidas.
Cinco Passos para uma Meta
Vamos partir de um pressuposto. Você
sabe o que quer, para onde deseja ir. Se
está em uma empresa que não lhe agrada,
buscará outra. Se está disponível, sabe
qual o perfil da vaga que lhe interessa.
Se está satisfeito em sua posição atual,
almeja alcançar um cargo mais elevado.
Uma meta, qualquer que seja ela, só pode
ser assim conceituada quando traçada
segundo cinco variáveis. A primeira
delas é a especificidade. Seu objetivo
deve ser muito bem definido. Assim, não
adianta declamar aos quatro cantos do
mundo “Quero trabalhar na multinacional
ABC Ltda.”. Desculpe-me a franqueza, mas
acho que você não será contratado a
menos que pense “Vou trabalhar como
Gerente Comercial, na Divisão Alfa, da
companhia ABC Ltda., atuando na
coordenação e desenvolvimento de equipes
de vendas para a Região Sul”. Quanto
mais específica for a definição de seu
propósito, mais direcionado estará seu
caminho.
A segunda variável é a mensurabilidade.
Sua meta deve ser quantificável,
tornando-se objetiva, palpável. Em nosso
exemplo anterior, você teria que
definir, por exemplo, a faixa de
remuneração desejada. Uma outra situação
bem ilustrativa desta variável é a
aquisição de bens materiais. “Pretendo
comprar um carro”, é um desejo. “Vou
comprar um veículo da marca XYZ, modelo
Beta, com motor 2.0, dotado dos
seguintes opcionais (relacioná-los) com
valor estimado em R$30.000,00”, é uma
quase-meta.
A próxima variável é a exeqüibilidade.
Uma meta tem que ser alcançável,
possível, viável. Voltando ao exemplo
inicial, o objetivo de integrar o quadro
da ABC Ltda. como Gerente Comercial não
será alcançável se você tiver uma
formação acadêmica deficiente,
experiência profissional incompatível
com o perfil do cargo e dificuldades de
relacionamento interpessoal.
Chegamos à relevância. A meta tem que
ser importante, significativa,
desafiadora. Você decide como meta anual
elevar o faturamento de seu departamento
em 5% acima da inflação. Porém, seu
mercado de atuação está aquecido e este
foi o índice definido – e atingido – nos
últimos dois anos. Logo, é preciso
ousadia, coragem, para determinar um
percentual superior a este, capaz de
motivar a equipe em busca do resultado.
Lembre-se de que o bom não é bom onde o
ótimo é esperado.
Finalmente, o aspecto mais
negligenciado: o tempo. Muitas metas são
bem definidas, mensuráveis, possíveis e
importantes, mas não estão definidas num
horizonte de tempo. Aquela oportunidade
de negócio tem que ser concretizada até
uma data limite. Aquela reunião tem que
ocorrer entre 14h00 e 16h00. Aquele
filme no cinema tem início às 21h30 e
sairá de cartaz na sexta-feira próxima.
Procrastinar, nome feio dado à mania de
adiar compromissos, cabe como uma luva
aqui e confere um golpe mortal a
qualquer meta proposta.
Metas, Realização e Resultados
No mundo das corporações as coisas nem
sempre funcionam assim. Observamos o
reinado do “auto-engano”. Metas são
estabelecidas para justificar
investimentos, agradar acionistas. São
fixados objetivos com base em
expectativas irreais, prevendo
crescimento da ordem de dois dígitos
independentemente de incertezas
políticas e econômicas. Poderiam até ser
alcançáveis dentro de um espaço de tempo
adequadamente delimitado. Mas como não
se pretende mexer nas variáveis tempo e
exeqüibilidade, alteram-se as variáveis
mensurabilidade (daí os balanços
maquiados, ou melhor, a “contabilidade
criativa”) e relevância (daí qualquer
meio ser justificável, inclusive rasgar
a Carta de Valores, praticar downsizing
a qualquer custo, desviar o foco do
negócio, promover fusões e joint
ventures desprovidas de fundamentação).
As pessoas buscam realização. Mais do
que um ato, um estado de espírito. Mais
importante do que o fato concretizado, a
satisfação de tê-lo feito.
As empresas, por sua vez, buscam
resultados. Mais do que a conclusão, o
fim de algo em si mesmo. Estes
resultados podem ser representados por
mais lucro, mais espaço no mercado, mais
clientes. Ou seja, invariavelmente deve
significar “mais”, embora não raro acabe
por tornar-se “menos”.
Decorre deste estado de coisas que
acabamos por ter um grande teatro onde
planejamentos são criados, estratégias
inventadas, profissionais desmotivados,
valores corrompidos. A verdade é
mascarada, a integridade é volatilizada.
Há, infelizmente, uma distância quase
incompatível entre metas corporativas e
metas pessoais. Salvo exceções,
conciliá-las pode não passar de retórica
barata. O executivo pretende vigiar sua
saúde, assistir à sua família e obter
realizações palpáveis em seu ambiente de
trabalho. A empresa diz que o apóia, mas
exige-lhe pesada carga de trabalho,
impõe-lhe a necessidade de resultados
expressivos, cultiva-lhe o stress e a
insegurança.
A Meta deve ser Você
Particularmente, não compactuo desta
ditadura. Resultados não são tudo, assim
como não é o cliente quem manda na
empresa. Resultados devem ser buscados
com persistência, assim como clientes
devem sem atendidos com maestria. Mas o
fim de tudo deve ser o sentimento de
realização, a satisfação de dever
cumprido. Ainda que a contabilidade diga
que você trocou seis por meia dúzia...
Por isso, estabeleça e mantenha o foco.
Parafraseando os Irmãos Pedro Lopes,
“várias flechas não garantem o acerto do
alvo, e vários alvos confundem o
arqueiro”. Esteja preparado para os
tombos – um obstáculo é apenas uma das
etapas do seu plano. Use a vaidade e o
dinheiro como bons estímulos, mas jamais
como objetivos. Redija suas metas de
forma nítida, cuidando para que elas
sejam específicas, mensuráveis,
alcançáveis, relevantes e temporais.
Dê-lhes todo seu esforço e imaginação.
E, finalmente, lembrando Richard
Carlson, “pense no que você tem, em vez
do que gostaria de ter. A felicidade não
pode ser atingida quando estamos o tempo
todo desejando novas metas. Quando você
focaliza não o que se deseja, mas o que
tem, termina obtendo mais do que
gostaria”.
Tom Coelho, com graduação em Economia
pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP e
especialização em Marketing pela MMS/SP,
é empresário, consultor, escritor e
palestrante, Diretor da Infinity
Consulting, Diretor do Simb/Abrinq e
Membro Executivo do NJE-Fiesp.